terça-feira, 21 de abril de 2009

Liberdade alucinógena .

drugs

Créditos pela imagem: Ditch the Kitsch!!

- E agora eu vejo tudo da forma que sempre quis ver. As árvores realmente têm vida e posso ouvir e ver suas enormes bocas se revelando no meio de suas copas e soltando as mais alegres gargalhadas, que ser humano algum poderia fazer igual. O céu tem mais cores! E tantas que eu mal poderia enumerar... Só o azul tem tonalidades tão diversas, que a maioria jamais eu vi. Eu posso enfim sentir a alma das pessoas, desnudar suas mentes e compreender o incompreensível.

Eram essas palavras que Marcos costumava dizer após se drogar, ou seja, cerca de quatro vezes por dia. Acreditava que elas aumentavam sua percepção e que a partir disso estaria mais perto de desnudar todos os mistérios do universo que os caretas jamais saberiam.

Quando estava sob o efeito dos alucinógenos não havia problemas. Tudo era um grande paraíso do incomum, onde o inusitado era sempre fantástico e maravilhoso. Ali não havia contas atrasadas, não havia hipocrisia e tudo era mais belo. Em vez dos tons de cinza da cidade, tudo ao se redor se transmutava em uma beleza quase inimaginável. Tudo era uma mescla de naturalidade, encanto, pureza e encanto. As samambaias pareciam brotar junto aos raios de sol e toda a sujeira teria se desmaterializado para outro plano do universo.

Nesse seu mundo não existiam políticos corruptos e carniceiros. Aliás, sequer havia governantes. As pessoas andavam nuas pelas ruas e o amor era livre. Não existia o pecado.

O sexo era sempre entrega daqueles que o praticavam. Era pureza em essência e forma bruta até mesmo nas orgias. Tampouco existia violência, trapaça, cobiça ou inveja. Todos se respeitavam e se compreendiam. Fazia-se assim o mundo que sempre quis da forma que sempre concebeu em sua mente.

Mas logo os efeitos das drogas passavam e mais uma vez Marcos tinha que voltar para a realidade, onde tudo era mais bruto e rígido. Ali não havia lugar para essas utopias malucas que só realizam numa mente alucinada.

Logo, a única solução era tomar mais alguma dose. Mas não havia dinheiro.

O que fazer? Era preciso conseguir mais. Era preciso voltar para o mundo que sempre quis. – Não! Me poupem, malditos! Desliguem esse barulho! Abaixem o volume, seus desgraçados! – Era o que gritava desesperadamente da janela de seu apartamento no quinto andar aos carros que trafegavam a famosa e movimentada avenida, na qual estava localizado seu prédio.

Logo, se derramava em lágrimas. Precisava sair daquilo. O que fazer? Talvez algum furto resolvesse a questão. Talvez vender drogas também fosse, mas não confiava em si mesmo para isso. Tinha medo de comprar e acabar as consumindo ou dando boa parte para os amigos.

Quem sabe então se prostituir? Não se achava feio. Bem que poderia ganhar alguma grana como gigolô, pensava.

Porém, a despeito do fato de que sua casa não tivesse mais muita coisa, ainda possuía uma televisão. Poderia vendê-la e adiar um pouco esses seus planos apesar, que em seu íntimo soubesse que uma hora ou outra teria que ceder ao roubo, ao tráfico ou à prostituição. Quando refletia sobre aquilo parecia tudo muito caro e a incerteza lhe tomava. Será que valeria a pena?

Só que embrança daquele mundo louco e belo lhe tomava de assalto.

- Claro que valeria! E valeria muito! O que importava era fugir daquilo para se tornar outra vez.

E assim saiu apressado para vender o aparelho e um ferro de passar que era presente de sua mãe. Nem lhe servia para muita coisa mesmo. – pensava. E então dizia para si mesmo:

- Afinal de contas, eu gosto de roupas amarrotadas! Não é mesmo! Não é mesmo! De que me importa o que os engomadinhos vão pensar!? Eu não me visto elegantemente, mas sou mais vivo que eles. E não tenho correntes em meu corpo! Minha áurea é tão intensa quanto a mais pura água cristalina que à noite é cortada por raios do luar!

Logo saía do apartamento rumo a uma praça onde costumavam comprar esses objetos usados. Conseguiu vendê-los rapidamente e por um bom preço. Saiu então em direção à casa de um traficante que era de sua confiança para que pudesse comprar o que tanto queria.

Agora poderia mais uma vez se libertar. Isto é, pelo menos até lá pelo meio da semana, quando o dinheiro e as drogas viessem a acabar de novo...

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19 comentários:

  1. Uma prisão disfarçada de liberdade.

    Texto muito bem escrito, rapaz!

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  2. Muito bom seu texto, empolgante, daqueles que se você começa termina,
    as drogas são assim mesmo, vão te levando, empurrando, até que um dia, ou ela te mata de overdose ou te mata de loucura e depois de overdose.

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  3. Tu escreve muito bem! vou virar seguidora do teu blog!

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  4. Oi,estou aqui para convidar você a votar para escolher os três blogs que ganharão um livro da Editora Zahar na Blogagem Coletiva - Dia Nacional do Livro , quem foi seu Monteiro Lobato. São 8 blogs concorrendo com textos belíssimos. Apareça por lá , leia os textos e vote com uma breve justificativa.
    http://fio-de-ariadne.blogspot.com/2009/04/bc-monteiro-lobato-lista-de-votacao.html

    Abraço

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  5. eh uma prisão disfarçada

    se puder
    http://sonabrisa.nomemix.com/

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  6. Gostaria de dar meu ponto de vista sobre esse post, mais confesso que estou um tanto apressado(por agora) e não quero deixa pra depois o meu singelo agradecimento a sua visita ao meu blog, sua opinião me chamou a atenção pela sinceridade e é isso que realmente importa em um comentário, não é verdade??


    Voltarei, concerteza.
    Um grande Abraço Diego,
    Sucesso hoje, amanha e sempre.

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  7. Diego, já disse que adoro os seus textos e seus comentários? Não! Pois eu os adoro.


    No caso, deste cara aí, ele se tornou prisioneiro da sua própria liberdade. Um ciclo vicioso, com o perdão do trocadilho.

    No mais, um ótimo feriado!

    Beijos!

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  8. "E não tenho correntes em meu corpo!"
    Tolinho.

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  9. Muito massa *o*
    Gosthei doi txt
    abraços =D


    http://park-br.blogspot.com

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  10. eu ja usei drogas, e quando tinha sol pra mim na minha cabeça chovia eu ouvia vozes, acredita que nada existia enfim mto loko kkkkkkk

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  11. Excelente texto! O mundo está cada dia mais cheio de gente como esse Marcos. Quem deve rir disso são os traficantes!

    Cara, numa empresa onde trabalhei teve um cara que matou a mãe durante uma crise de abstinência. Em algum momento antes de fazer isso ele deve ter sido igualzinho este Marcos.

    Um abração.

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  12. Quantos Marcos estão por aí, vivendo uma vida irreal e alucinante, e loucos para que tudo isso acabe logo. De uma forma ou de outra.
    Este texto é para ler e pensar.
    Um abração.

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  13. um Marcos já passou na minha vida. pas-sou, que nem o barato dele passava.

    uma pena.

    *lembranças, lembranças...

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  14. NOssa, muito massa esse teu blog, queria ter um template assim, do meu blog é horrível tá loco...

    E vc concerteza escreve muito bem...

    Abraço

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  15. isso é liberdade??? não,... isso é escravidão!

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  16. Pois é cara.
    Teu texto começou bem pacas, ta muito bem escrito, mas nao escondo uma certa decepção que de um alucinado esperava alegorias menos óbvias.
    Não é uma crítica, veja bem, mas sim uma expectativa de um leitor que se entrega de verdade.
    "Nesse seu mundo não existiam políticos corruptos e carniceiros." Tolinho.
    Pela força do texto e do começo arrasador, pede mais que isso.
    Faz a gente viajar mais dentro do delirio do cara.
    Veja bem, é minha opnião.
    Qualquer coisa joga fora (rs).
    Mas achei o texto bom demais para arriscar pouco, sacou?
    abração!!!

    http://martonolympio.blogspot.com/

    ps.: buuuuuuuuuuhhh! (pra passar o soluço!)

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  17. Por isso, por estar neste processo inicial (que na verdade meu velho, nunca acaba :) que acho bacana ler os grandes.
    Beba no Sabino, no Rubem Braga, Cortazar, Rubem Fonseca, Paul Auster...
    Direções diferentes e intenções diferentes.
    Mas com certeza vão te apontar um caminho!

    abração.

    ps.: e continua escrevendo. Pq pra gente, não tem outro jeito.

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  18. Cara, você escreve muito bem! E era o tema que eu procurava: um usuário de drogas que vive um mundo bonito ao se drogar.

    Vou seguir seu blog =]

    Obs: Sou do Projeto Kraft. (http://projeto-kraft.blogspot.com/)

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