Toda memória é um troço meio machucado. Por trás de cada
lembrança mesmo que acompanhada de sorrisos, acaba vindo sempre um sensação de
peito se comprimindo. Ficando assim meio apertado.
A memória que é
sempre um pouco invenção faz-se tempo que já não existe mais. Tal como se ladrasse querendo se salvaguardar
pra dizer que somos alguma coisa na vida e no mundo.
Toda memória que predomina em algum lugar efetiva-se
enquanto atentado às outras tantas que também querem falar.
Uma memória é o que foi, mas também é o que poderia ter
sido. Quantas paixões e quantos amores se tornaram projetos falhos, mas que em
algum momento foram possibilidades? Quantas ações poderiam ser apenas sequência
de nossos planejamentos sonhados? Quantas vezes as utopias poderiam ter
esmagado a tirania daquilo que nos impede de sermos em completude?
A memória é como uma lesma que passeia pelo presente.
Insiste em não nos deixar esquecer nossos piores aspectos, nossos piores erros,
nossos mais assustadores traumas. Às vezes se torna tão incômoda que o único
caminho é ocultá-la. Fingirmos que esquecemos. Porém, quando a escondemos ela
cresce mais e torna cada vez mais tenebroso revisita-la. Toma então para si em
partes nossa mente lá onde fazemos de tudo para não sabermos como algo que também
nos é.
Às vezes a memória é como um encontro. Nela nos percebemos
enquanto bichos humanos. Afinal, apenas homens e mulheres são seres no tempo.
Apenas nós nos identificamos no passado, requerendo-nos sermos outra coisa no
futuro. Nisso a beleza, nisso a lamentação. Porque aí se desvela um castigo,
mas que coloca a partir das contradições as chances de redenção.
É que a ousadia de um novo tempo necessariamente haverá de
evocar alguma memória. O presente é puro e límpido, mesmo que não o aceitemos
como é. Contudo, ele nunca se desvinculará totalmente do que se fez o peso e a
leveza de todos os tempos vividos pela humanidade.
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